Narrativas negras na educação
Mainara Thaís - Educativo Piraporiando

Chega novembro e o assunto se alastra. Nos comerciais, nas publicidades e em ações dos mais diversos segmentos a questão racial acaba aparecendo, seja de modo direto ou indiretamente. Considerando a movimentação social despontada, muitas vezes o campo da educação segue os passos da sociedade. Durante o mês, se torna comum presenciar os calendários escolares organizando feiras, programações, palestras, atividades... E por aí vai. Também não é raro ver essas programações intituladas ou correlacionadas com o "mês da consciência" ou "novembro negro", em alusão ao dia 20 de novembro, dia Nacional da Consciência Negra no Brasil.
Em um país que reluta contra a sua história tentando apagá-la, realmente é necessária a criação de uma consciência, sistêmica e combativa. Uma consciência que enxergue as consequências do racismo numa perspectiva estrutural, que perceba as lacunas históricas deixadas e que entenda, acima de tudo, que falar sobre e combater o racismo não pode ser algo restrito às pessoas negras, já que diz respeito à sociedade como um todo. A luta antirracista é um compromisso diário e coletivo.
É maravilhoso que tenhamos nossos olhos voltados para a questão racial durante novembro, mas, ao mesmo tempo, é necessário se atentar às ilusões que isso pode trazer. Num país que trata o racismo como tabu, falar sobre o panorama racial brasileiro não pode ser algo limitado a um mês. Com a adoção de uma programação específica, muitas vezes a impressão deixada é a de que "o papel foi cumprido". De fato, naquele momento, a articulação é importante e com certeza gera resultados. Por outro lado, como fica a organização dos nossos conteúdos e práticas para o resto do ano?
Outro problema comum é a utilização do mês para uma retratação equivocada das pessoas negras, reforçando estereótipos ou colocando essas pessoas numa ótica reducionista. A exotização dos corpos e culturas negras espalhadas em inúmeras sociedades é mais uma tática racista de construir uma imagem distanciada e negativa no imaginário coletivo. É necessário que discussões para além do racismo sejam mobilizadas. Produções e contribuições negras devem ser celebradas e reconhecidas.
Levando em consideração essas reflexões, você já parou para pensar sobre quais e como são as narrativas negras encontradas no âmbito educacional?
Podemos encarar essa pergunta sob duas perspectivas. A primeira seria relacionada às imagens atribuídas às pessoas negras, ao processo de construção de um imaginário coletivo que segue uma dinâmica social própria e encontra nos espaços educacionais a naturalização de comportamentos e concepções. Apesar da Lei N° 10.639 obrigatorizar o ensino da história e cultura afro-brasileira no currículo escolar, a colocação prática disso ainda é tímida e esbarra em muitos desafios. Já a segunda concepção estaria relacionada à própria vivência de pessoas negras nos espaços de ensino, sejam eles formalizados ou não.
Apesar da população negra representar a maioria do país, os índices relacionados à alfabetização, desempenho educacional e níveis de escolaridade revelam a disparidade entre as oportunidades e a própria ocupação desses espaços, que, mesmo com ações afirmativas, ainda se mostram como um desafio. Ao falar sobre acesso à educação, precisamos falar sobre democratização do ensino e isso pressupõe necessariamente a luta por políticas equalitárias e pela criação de espaços inclusivos, considerando a realidade social vivenciada no país. Não podemos abrir espaços para relativizações. O racismo diminui, mina, sabota e mata. É necessário lutar contra esses mecanismos.
Por isso, a construção de novas narrativas na educação não é feita apenas na adoção de outras propostas pedagógicas e remobilização dos conteúdos. A construção de novas narrativas passa pelo compromisso com a luta antirracista e, consequentemente, pela visão e construção de espaços mais acolhedores. Passa pela garantia à educação e ao ensino de maneira democrática (afinal, sabemos que disponibilidade e acessibilidade são coisas distintas). A percepção da realidade também é produzida a partir das nossas narrativas. Por isso, que o nosso compromisso com essa produção seja perpétuo e que os frutos de novas posturas sejam colhidos dia após dia.